Assassinato de crianças no Rio de Janeiro mostra que, ao tempo em que o governo deve investir em políticas voltadas à Segurança Pública, a formação do cidadão consciente se inicia em núcleo familiar.
Matheus Fonseca
O episódio conhecido como “Massacre de Realengo” não só gerou pânico e indignação pelo País, como reacendeu o debate sobre circulação, comércio e porte de armas de fogo entre a sociedade civil. A chacina – que culminou com a morte de 12 crianças e suicídio do próprio atirador – ilustra o quadro de violência generalizada e insegurança típicas da crise na Segurança Pública. Ocorrida em 07/04, a tragédia, trouxe à tona a questão sobre iniciativas do Estado na defesa do “cidadão de bem”, e repercutiu em vários segmentos sociais. O crime, organizado ou não, já não responde sozinho pelo clima de insegurança instaurado na população. Com o acesso irresponsável do cidadão comum a armas de fogo tornam atos criminosos e tragédias cada vez mais próximos. O problema, agora, é também da porta para dentro.
Logo no dia 08/04, um dia após Wellington Menezes de Oliveira invadir sua ex-escola e tirar a vida de 12 inocentes, o presidente do Senado Federal, José Sarney, manifestou-se favorável à realização de novo plebiscito sobre o comércio de armas de fogo no Brasil. O senador Sarney busca o apoio da sociedade para promover uma revisão da Lei 10.826/2003, mais conhecida como Estatuto do Desarmamento, norma que estabelece regras para a aquisição e o porte de armas. Segundo o senador, não se trata de desrespeitar a opinião do povo, mas de ouvi-lo novamente (em 2005, através de referendo popular, a maioria da população brasileira rejeitou a proibição da venda de armas e munições). Tal posicionamento soa um tanto quanto oportunista, uma tentativa de “mostrar serviço” frente ao descrédito da população quanto às atitudes do poder público no combate à violência. O “surto” que possuiu o atirador no episódio de Realengo, apesar de ter ocorrido de forma pontual, dá mostras de uma personalidade deturpada. Impossível prever se aquele que se mostra tão próximo distribuirá abraços, flores, socos ou pontapés, mas as razões sociais que levam a atos impensáveis estão na raiz do problema da violência.
A propositura do Senado – agir às pressas com a realização do plebiscito já em outubro – é questionada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia. "Nós já fizemos um plebiscito, que demonstrou a opinião da população acerca do desarmamento e que foi, na minha avaliação, muito firme, muito contundente”, afirma. A opinião do deputado é compartilhada por Ophir Cavalcante, presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). "O plebiscito pode ser uma cortina de fumaça para desviar o foco dos reais problemas de segurança que devem ser enfrentados pelo governo, além de se constituir num desrespeito à vontade popular legitimamente expressada no referendo de 2005". A polêmica está, definitivamente, instaurada, com o povo no centro do fogo cruzado.
A opção “popular” por manter o comércio de armas e munição obteve saldo positivo? Não se trata somente de uma questão de números, estatísticas e indicadores. É necessário refletir se decisões tomadas “pelo povo” se mostram mais eficazes do que medidas impostas pelo governo, sob a égide da Lei (como a Lei Seca e suas rígidas penalidades). Fácil é o Estado eximir-se de culpa através de referendos que nada mais são do que ferramentas de pseudo-democracia, assim como é conveniente ao núcleo familiar culpar os políticos pelos infortúnios cotidianos. A sociedade precisa aprender a defender-se dela mesma, pois o “cidadão comum”, quando mal intencionado, transforma qualquer objeto à mão em arma letal, seja um revólver, um carro, um pedaço de pau ou um simples clipes de papel. E não há plebiscito que imponha berço, educação e cidadania.
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